Falar sobre este livro é, para mim, um pouco difícil, pela dor que me causou e ao mesmo tempo pela grande ternura que nutro por ele, mas, principalmente, pelo deslumbramento que me atingiu ao lê-lo.

Que dizer do único livro que li até hoje que me fez verdadeiramente chorar e me causou um desconforto físico e emocional?

Que dizer do livro que me revelou o poder dos livros?

Foi o primeiro livro que recebi como presente de aniversário, “só com letras”, um livro como o dos adultos, o que, só por si, já foi mágico, pois simboliza a transição da infância para a realidade dos adultos e não havia melhor livro para simbolizar essa passagem que estava a experimentar na vida real, e agora ganhava forma em termos físicos e simbólicos!

Li-o tinha 10 anos, e foi, com ele, que descobri o poder da literatura. Experimentei pela primeira vez como aquele objeto, à primeira vista inerte e inofensivo, pode ganhar vida e remeter-nos para um mundo de emoções, tirar-nos da nossa zona de conforto e apresentar-nos novas realidades… ou pior… espelhar as nossas dores de tal forma, que nos obriga a olhar para elas quando delas andamos a fugir, quando não nos queremos enfrentar.

Tenho um desgosto enorme por o ter perdido. Nas andanças da vida, não sei quando nem como, ele perdeu-se. Mas não a sua memória. Não o forte impacto que teve em mim. Isso fica para sempre comigo, faz parte de mim, é parte de mim.

Não fazia sentido não o ter, por isso comprei um novo, mas não é a mesma coisa…

A capa mudou, o que me lembra a tudo o momento que não é “ele”.

Que magia é esta que nos prende de tal forma a um livro como se fosse único? Aquele era o meu. Este não é. Foi com o outro que tremi. Foi com o outro que me espantei. Foi com o outro que chorei. Foi com o outro que as minhas mãos trémulas queimavam sempre que o agarravam. Sim, porque o “outro” queimava.

Este é apenas a representação física dessa lembrança.

Escrito por José Mauro de Vasconcelos, narra a história autobiográfica de Zezé, um menino de seis anos e de como ele lida com os acontecimentos da vida. O enredo gira à volta da sua relação com uma árvore existente no quintal de sua casa, o seu pé de laranja lima, que é o seu único amigo fiel e confidente…

De uma forma comovente e enternecedora, vamos acompanhando a infância difícil do protagonista, vendo, pelos olhos de uma criança, como o ambiente interno e externo marcam a nossa infância de forma indelével e como uma criança, para fugir à realidade dura da vida, cria um mundo imaginário onde se refugia com o seu melhor amigo.

Temas como o amor, a amizade, a pobreza, a violência física e psicológica e a perda, são vividos pelo olhar de uma criança, atingem-nos profundamente. E como a sua relação com a Natureza também pode ter um carácter curador e servir de analogia para a transição da infância para a vida adulta.

Um livro para todas as idades, daqueles que nos marcam para sempre, é um clássico da literatura brasileira de leitura obrigatória.

“A minha dor era menor que a minha raiva”

(José Mauro Vasconcelos, in “O Meu Pé de Laranja Lima”)

(Marta Monteiro Alves)

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