

Poucos livros, escritos nas últimas décadas, marcaram tanto o nosso tempo como este, dando origem mesmo a programas de televisão com o mesmo nome.
Esta é uma daquelas obras-primas obrigatórias de se ler para melhor se compreender o séc. XX e, quem sabe, mesmo o séc. XXI.
É uma distopia escrita em 1948, e diz-se que o título do livro veio da inversão dos dois últimos dígitos (uma sugestão do editor), pois, ao que parece, Orwell ter-lhe-ia dado outro título.
Li-o na minha juventude. Na época estávamos em plena guerra fria, em que a luta política e ideológica entre regimes democráticos e sociedades totalitárias estava ao rubro, pelo que teve em mim um forte impacto.
A história passa-se em Londres que tem como líder supremo o “Big Brother” que tudo vê. Ele assumiu o poder após uma guerra mundial que destruiu os estados-nações até aí existentes, dando origem a 3 grandes estados totalitários, onde a opressão é a marca distintiva.
A personagem Winston Smith (que pode ser qualquer um de nós) trabalha no “Ministério da Verdade” e a sua função é reescrever o passado e os os acontecimentos, de acordo com a narrativa que convém a cada momento do presente e de acordo com a vontade do “Big Brother” (mesmo que isso implique a falsificação ou criação de documentos de suporte).
Verdade e Mentira.
Realidade e Ficção.
Passam a ser “moldáveis” consoante os interesses do poder. A verdade passa a algo instrumental, ao ponto de já não se conseguir distinguir o que é verdade ou não.
Os significados das palavras passam também a ser meros instrumentos da narrativa que se quer construir, dando assim origem a uma “Novilíngua”.
Algo que nos parece absurdo e assustador, mas que nos alerta para os tempos que correm. Não estaremos nós já a viver um pouco isso?
Neste regime totalitário imaginado por Orwell existe ainda a “Polícia das Ideias”, uma verdadeira patrulha do pensamento. Também não é algo que já hoje nos faz pensar?
Quando se assiste ao cancelamento de escritores, artistas, etc., quando se assiste à retirada de obras de bibliotecas e quando se assiste ao reescrever de obras, alterando o que o autor escreveu de forma a não ferir suscetibilidades, não estaremos a ir longe demais?
Na distopia Orwelliana vive-se num ambiente de opressão e de submissão levado ao limite, onde até as relações amorosas são proibidas.
Neste regime não há leis. Há regras.
Regras de conduta e de pensamento, que são ditadas pela vontade e interesse do “Grande Irmão” que tudo vê.
Este livro traz-nos uma visão sinistra e sombria do que pode vir a ser o futuro da Humanidade, se ficar nas mãos de regimes totalitários apoiados pela tecnologia. Não são os nossos passos também já hoje completamente identificáveis através do uso das tecnologias?
Este livro alerta-nos para o perigo do abuso de poder, e tem como base a ideia que o poder corrompe.
Apesar de já ter sido escrito há alguns anos considero-o extremamente atual, uma vez que a liberdade e a democracia não podem ser dadas como adquiridas.
Constroem-se todos os dias.
Cabe-nos a nós estarmos vigilantes, ou um dia arriscamo-nos a adormecer numa sociedade livre e democrática e acordarmos, sem saber bem como, num regime totalitário.
(Marta Monteiro Alves)
Autor:
George Orwell